quarta-feira, 3 de julho de 2013

DIA DE K.



(Robert Crumb)



Hoje, três de julho, eu jurava que iria ter um dia de K pela frente: Iria acompanhar meu irmão para fazer seu RG, e em seguida tentar falar com alguém de uma empresa de telefonia, sobre uma cobrança indevida. Talvez por ser aniversário de nascimento do escritor Franz Kafka, imaginei que meu dia seria igual a seus romances.


Entre as ‘esperas’ do dia: Me lembrei mais uma vez dele, quando morreu não era dos mais populares – Como escritor e muito menos como figurinha de Praga. Hoje a capa do Google foi em sua homenagem. Duvido que Kafka fosse ter um blog hoje em dia, por exemplo. (Machado, sim! – Mas, só se pagassem ‘algum’ pra ele escrever). - Gostaria muito de aqui nestas linhas, seguir por essa crônica falando de minhas motivações para se escrever em um, assina-lo e sonhar com livros pós-blog; só em parecer que ouso me arremedar com esses dois, já me sinto um inseto (uma barata?) com fumos de ‘linha ordinária’ indo por buracos de agulha. 


Não... Nesse caminho estou ‘imerso na neve’ durante a noite (entre brumas e trevas), e ainda nem enxergo o Castelo - Quem dirá o final...


As tarefas ordinárias não se metamorfosearam em demorados processos. Se assim fossem me renderiam uma boa crônica: Faria aqui um paralelo com as situações absurdas do meu dia, ao entrar/ser atendido no prédio/castelo da empresa telefônica... Obviamente não teria conseguido nem sequer ser ouvido por alguém de lá e finalizaria essa carta dizendo que por um dia eu fui Joseph K. – Nada disso aconteceu. Foi tudo bem, até cafezinho ganhei.


No livro ‘O Castelo’, há dois personagens que são os assistentes do agrimensor K. – No romance não afirmam se são irmãos, embora a única diferença entre eles fossem os nomes. Como todos no livro, eles parecem agir ao contrário do que suas funções dizem. O pobre protagonista é o único que tem alguma certeza ou lucidez naquele pesadelo. Pela manhã quase que meu irmão e eu saiamos com camisas idênticas; quem iriamos atrapalhar? – Troquei de camisa e foi a melhor parte do meu dia estar com ele.


***


Kafka tinha um pai, que ao ver os filhos felizes quando criança os encorajava perguntando se dava para comprar alguma coisa com aquela alegria. Mas se não fosse esse anti-pai, não haveria o escritor; Scott Fitzgerald tinha a esposa para o atormenta e abastecê-lo; Machado (suspeitam alguns) também foi traído por Carolina; Borges se tivesse passado da sala para o quarto com qualquer uma de suas cortejadas, provavelmente não ficaria tanto tempo na biblioteca; Dom Quixote só começou a galopar com Cervantes na cadeia, a mesma que acabou com as unhas e o dandismo de Oscar Wilde, mas que lhe deu De Profundis. Para Shakespeare e Dostoievski bastou nascerem neste mundo. – Não sei se posso dizer ainda bem no aniversário do Kafka para o que ele passou; muito menos dar viva para a cruz de cada escritor. – Sei das minhas.


Quando só pensava em futebol e paquerar as menininhas da escola, com treze anos eu tive um sonho que nunca esqueci: Eu me transformava involuntariamente numa barata a cada cinco minutos. Foi um choque saber anos depois (aos dezenove) que alguém tinha tido o mesmo pesadelo um século antes. Quando Kafka lançou o primeiro livro, ninguém deu a mínima: Em casa, na rua ou nos cafés de Praga. Só muito tempo depois é que todo mundo começou a abrir os olhos daquele sonho.


Falando em sonhos, tem uma frase muito bonita do Kafka sobre um livro: “Gostava de sonhar que lia num imenso salão lotado, e em voz alta, toda a Educação Sentimental, de uma só vez, por quantos dias fossem necessários, fazendo as paredes reverberarem”.


Kafka não me deu apenas assunto para hoje. Deu também um nome para esses que despertam de sonhos intranquilos: Gregor Samsa. – Por isso, obrigado!

Cid Brasil

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