terça-feira, 7 de maio de 2013

OS ELEVADORES DE SÁBADO A NOITE



(House at Dusk - E.Hopper)


O elevador não havia chegado. Mais Cansado que eu de toda a mudança; de tudo haviam restado apenas três cabides em minhas mãos, estava realmente cansado, tanto que me repetia. Ouvi os roncos desse que descia, era um apito fino esse barulho, era o prenuncio de que algo aconteceria nesse elevador. Que não caia, pensei. 


Ao abrir, uma voz reclamou que havia esquecido algo, teria de subir novamente, podia? Claro! Era uma moça alta, de cabelos negros e sorriso de criança; a esquecida dona da voz.


Iria até o fim, e o fim era bem longe daqui, o fim era no décimo andar, bem longe do terceiro andar que escrevo. Ao entrar, recebo uma pergunta, um elogio e um olhar: Você é novo aqui, não é? Bonito seus sapatos – Subindo o olhar desses que já conhecia bem, flagrei os seus que nunca tinha visto mais negros em mim. Descobri aí seu sorriso de criança. Devolvi na mesma moeda: Uma pergunta, um elogio e um olhar: Qual seu nome? Que bonito... E diferente! Seus olhos... São verdes! Eram verdes, os olhos de Alexia, que só agora eu percebia. Todo mundo confundia o olhar de Alexia, será que eu fazia o mesmo nesse elevador? Confundindo os pensamentos por trás desse olhar, pedi através dele que o elevador parasse.


Só não caísse, já era quase o terceiro, mas por deus que não caísse, não queria fazer feio no primeiro dia perante Alexia. 

Não, vamos subir, podia? Desço na volta! Foi o meu disfarce, fingindo charme perante o vacilo de esquecer qual andar que alugara, ou seria esperteza? Não, vamos! Só assim conheço melhor o prédio. Sorriu. Sorrimos do nome do sindico: Fausto – Demonstrou inteligência, sorriu de outra piada que fiz: Um ponto pra Goethe, zero para o apresentador de televisão.  Fiz um pacto com mefistófeles, ‘pare esse elevador agora e na volta, leio de enfiada sua vitória, no original, em alemão’. Como sabia ser mentira, o tinhoso me travou a língua no quarto andar. – Pelo menos que não caia.  No quinto, minha companheira de viagem indagou: Ainda nem perguntei teu nome, não foi? Faustosamente me apresentei. Tão bobo que me surpreendi não ter pontuado ao final: Um criado, ao seu dispor! – Pareceu adivinhar, e gargalhou.


E esses cabides menino? Disse ser o troco do pagamento da mudança, gargalhou novamente. Você é engraçado; é temporário? Por mim seria para sempre! (Ainda bem que não falei isso), não, não... É para sempre! (escapou!). Você vai gostar daqui, os vizinhos são tranquilo, silenciosos. Defeito aqui, Só esse elevador que é lento. Completei dizendo que até isso tinha suas vantagens. Quis saber quais. Ora, ter mais tempo para pensar antes de esculhambar o esposo. Casada? – Não, não. Eu também não. De repente... Parou! Mefistófeles me atendeu? Sim, mas para o próprio entrar no sétimo andar, em forma de velhinha simpática. 


Ainda perguntei no oitavo o que fazia: Era dentista.
  
O nono andar, foi dedicado a olhares através do espelho de fundo.


Desceram juntas no décimo, Alexia ainda olhou para trás, dividimos um boa noite, boa noite, baixinho. No quase fechar da porta reapareceu com os olhos verdes novamente: E seja bem vindo! – Parecia triste nesse último olhar. Só não disse agente se fala ou se vê. Desci os andares até o terceiro que me cabia.  Não havia ascensorista para dividir meu encanto ou investigações. Uma semana depois perguntei ao porteiro, sobre a Alexia daquele dia. Mudara-se no dia anterior.


Nunca contei isso para ninguém. Conto hoje, que voltei a andar de elevador.

Cid Brasil

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