segunda-feira, 2 de setembro de 2013

SÓ ISSO?



(Emiliano Ponzi)



Tem dias que só falta abrir o computador e a crônica já estar lá, noutros só com cesariana no teclado, mas tem aqueles em que ela só falta se enroscar em nossas pernas no meio da tarde, da rua ou da sala. Dia desses, me sentindo devedor também com quem já não lê ou escreve crônicas, fui até um lugar que basta uma caminhada por ele para brotar pensamentos de “Amor & morte” e entre dribles por moradas alheias, percebi de longe, algo como um cata-vento girando, girando, girando... Já perto de onde jaz o senhor: Adelmo de Medeiros França vi que se tratava de três círculos de diferentes tamanhos, suas cores eram compostas por fitas coloridas presas do aro até o centro de cada circulo que quando giravam formavam uma espécie de aquarela.


Talvez aquilo fosse criação do próprio senhor ali descansando, ou algo que ele gostasse muito de ficar olhando enquanto desfiava fios de pensamentos sobre os mistérios existentes abaixo das nuvens, ou aquilo simplesmente pode ter sido fincado ali por algum amigo gaiato do senhor Adelmo, lhe pregando assim uma última peça. Como eu nunca vi nada igual em shoppings ou feiras de artesanatos com climas de shopping, aposto que aquilo lá é mesmo invenção do senhor Adelmo de França, que pela foto perto do seu nome tem mesmo cara de professor pardal – É mais um para coleção de “Avôs que gostaria de ter”.


A residência do senhor Adelmo e de meus entes, tem uma cara de parque que não existe em Maceió. Possui um silêncio que nem o culto da igreja evangélica ao lado consegue atrapalhar. Os vivos gritam suas preces, que eu imagino que eles é que devem se incomodar com o silêncio do lado de cá, se irritando por verem no vizinho uma metáfora para suas perguntas. Não contentes, naquela tarde desafinava por lá uma banda gospel tão melódica quanto os ‘Sex Pistols’.


“Seria a vida só isso?”. É a pergunta que pela quinta vez me faço desde que entrei, percebo um senhor sentado num banco olhando para a dança que cinco eucaliptos fazem, estaria ele fazendo as mesmas perguntas que eu? Em pleno sábado, próximo das seis da tarde, num país tropical só existe o senhor do banco para me tirar essa dúvida naquele lugar. Como eu, é possível que ele também diga: “Que bonito!” para os eucaliptos já negros a frente do céu cinza desta tarde. Foi por me ver dizendo o que aquele senhor representava para mim a quinze metros, que imaginei possuirmos as mesmas dúvidas sobre as fichas do fliperama da existência.


Ele deve pensar: Tem gente que dá a volta ao mundo, beija mulheres espetaculares, tem filhos, publica livros, mora na praia ou em Paris e no fim ainda faz a mesma pergunta: “É só isso?”. E eu: Enquanto outros devem chegar aos oitenta do segundo tempo, sem nunca terem saído desse bairro simplesmente por que ainda não viram todos os movimentos que um eucalipto faz enquanto perde suas folhas através dos humores dos ventos, e que no fim ainda desenham com os lábios dizendo: “Que bonito!”.


Foi só na volta, que percebi o cata-vento do senhor Adelmo.

Cid Brasil

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