(Léon Spilliaert) |
Esse CD... O eterno CD que
escuto nessas horas. Decorei apenas o nome da primeira música, as outras nem
sei, ouço o CD inteiro sempre no repeat. Já ouvi tanto essa de número um que
dentro dela, já consigo mentalmente emendar o sax que inicia a segunda... Assim
até o final. É um pouco como me sinto ao pensar mais uma vez em você. Embora
não saiba seu nome completo. Só o primeiro. Mas sei quando vou começar a
lembrar de ti e onde acabara.
Não nos conhecemos, ou
melhor, (ou pior?) sabemos da existência um do outro. Só isso. Não sei o que
você gosta de comer, beber ou ouvir. Sei onde você trabalha; foi lá que te
conheci, e é só. Será que gostas daí ou ganha tão bem a ponto de se enganar dizendo
que sim? Penso sempre nisso, sempre depois de lembrar o teu nome. Por aí vou me
perguntando se tens amante, marido ou namorado. Sinceramente não perco o sono
por isso, perco por você, não por esses que nem sei se existem. Você eu sei.
Venho pensando em você há dias, assim como esse CD. Um dia antes desses, eu te
vi passar na rua, na minha frente, na porta de um banco, te vi e até esqueci a
quantas andava eu lá no juros especial. Te segui até uma quina e... Parei. Você
que seguiu, atravessou a rua e sumiu. Por que não falei contigo? Logo eu tão razoável
em inventar assunto; olha, acredite sou bem melhor do que escrevendo... Travei.
Chegar lá e o que? Me apresentar? – Sim! Devia te chamar e gritar: Hey! Tudo joía? Sou o fulano de tal, prazer!
– Tu não recordarias de mim, eu sei, foi muito rápido o nosso primeiro oi.
Era meio dia aquele dia, poderia perguntar se você tinha almoçado... Eu já, mas
almoçaria de novo, só assim saberia o que você gosta, só não abriria mão de
comer doce de leite novamente, e você? Iria te fazer rir nesse almoço, com o
que nem eu sei, talvez com minha falta de bons modos... Só que nesse meio de
dia eu não soltei o tal: Hey! Tudo joía?
Sou o fulano de tal... Nesse dia fui só as reticências.
Então só posso te dizer
daqui que estavas bonita com aquele cabelo mezzo
vermelho, mezzo castanho; assim como
na justa blusa da empresa que você vestia – E és, a única de lá que combina
naqueles tons. Teve outro dia, bem depois do primeiro oi, que te convidei para
assistir uma peça em que eu atuava, disseste que gostava de teatro. Só. Nem que
ia ou não ia. Não foi. Tudo bem, aquele dia fui péssimo mesmo: Entrei atrasado
e esqueci uma fala, igual no dia que não te conheci. Esse dia era uma terça (ou
quinta?) de sol, diferente dessa madrugada de agora ou do dia que foi hoje.
Falando nisso, fui lá hoje, já saí do banco atento, olhando, te catando... Iria
fazer tudo que não fiz.
Depois de pensar no nisso,
sei que depois vou me perguntar: Será que você sonha ou no mínimo dorme bem há
esta hora?
Talvez esteja acordada por
causa de algum idiota que ronca agora. Se sim, te digo que não chore, ele é um
canalha ao cubo, não te merece, só estava fazendo hora contigo. E se ele não
fez nada disso e não é nenhum canalha, pois é um bobo, um palerma sem
iniciativa, não propõe nada ou te chama para sair. Nem conversa sobre cinema ou
música. É um tolo, concordo contigo. Saiba que em matéria de tolo e palermice,
sou experiente como viu – ou não (me) viu! A proposito, o filme novo do Ricardo
Darín, já viu? Não conhece? É um puta ator argentino; dos melhores – Argentino também.
Mas o filme é fraco, sem poesia ou lirismo, chama-se ‘Elefante Branco’ – É eu
sei! Igual eu fiquei lá naquela esquina, feito um, só que moreno.
O CD... Ele já tá acabando,
falta uma música só, já o conheço, ele eu conheço, assim como eu, que nessa
hora exata da última música, é o momento de ir. Vou ter de ir agora, acho que
consigo dormir. Creio que sua imagem se indo irá (me) deixar dormir agora. Você
de costas me deixando... (mais uma vez!).
Cid Brasil
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