(Greg Eason) |
Naquela sexta-feira, muita coisa acontecia no mundo: Líderes mundiais
reunidos em São Petersburgo debatendo a crise econômica, os habitantes de
Nashville ansiosos pelo show da cantora Cat Power, no Malauí tinham vendido o
avião do presidente para alimentar os pobres e em Alagoas mais um caixa
eletrônico tinha sido saqueado.
Isso no mundo. Mas na loja
‘O Magnata dos Parafusos’, todos esses fatos não tinha o menor interesse para o
balconista (e meu xará) Alcides. Ele ainda era ontem, e ontem todos os fatos
que preenchiam os noticiários ainda não tinham acontecido. Ontem para o
balconista Alcides, era a comemoração de um ano de casado, e essa noticia (como
todas as outras) ele também não sabia. Ele não entendia como todos que conhecia
conseguiam tocar a vida, postar fotos na internet, falar ao celular, almoçar,
trabalhar... E sorrir já no dia seguinte quando respondia para seus conjugues
se era o fim mesmo que queriam.
Antes se hoje fosse uma segunda, murmurou Alcides. O fim de semana
começava e uma batalha na cabeça dele se iniciava. Errou trocos, nomes e
vendas. Brigou com o colega de balcão, logo um que quase não falava. Ninguém me
pergunta nada, pensava. Disse dois bonitos palavrões para um cliente como se
fosse para ela. Em seguida se acalmou ao imaginar que ela também deveria estar
mandando xingamentos, possivelmente até com os mesmos termos.
Dá próxima vez me caso com alguém rico... Disse ele (e talvez até
ela!).
Meio dia: Meio da angústia de se estar em pé sem estar: Ficou lá,
depois foi para o vestiário da loja, deitado no banco de ferro que mal dava pra
sentar. Olhando para cima e pensava: Então isso é o que sentia o Luiz do
almoxarifado? Preferia muito mais o Luiz do almoxarifado cantando aquela música
brega enquanto olhava o nada, do que seu melhor amigo que pagava prostitutas na
tentativa de apagar a ex. (Só Alcides sabia que o tal sempre broxava). Alguém
entrou no vestiário, palito nos dentes, cinto frouxo e sem fones de ouvido:
Ouvia notícias. Todo mundo queria saber do mundo. Saiu do vestiário, não pelo
que seus olhos sentiam e mais pelo que não dizia. Do orelhão discou o único
número que sabia de cor: O dela. Deu ocupado. Agora seria sempre assim, nunca
mais poder sentir ciúmes quando isso ocorresse, pensava.
Pensou em tirar uma foto sua e daqui a um ano diria que aquela era
sua expressão quando sofria. Talvez até rissem, como agora riam os da oficina,
como agora ria o próprio Luiz, o tal do almoxarifado. Nem foto e nem para quem
mostrar a foto daqui a trezentos e sessenta e cinco dias, pensou. Entrou na
sala de espera da loja, na televisão reprisavam tudo aquilo que Alcides já sabia
menos o que Alcides sentia. O ar-condicionado daquela salinha ajudava a pensar
melhor, nela só havia Alcides e um rapaz escrevendo. O moço disse que escrevia
uma crônica, Alcides perguntou o que eram crônicas. São textos sobre coisas
pequenas, respondeu o da caneta.
Então escute só, disse o meu xará.
Cid Brasil
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