terça-feira, 25 de junho de 2013

PELO POETA QUE HÁ EM NÓS


(Pablo Picasso)



Esbarro com uma foto de uma faixa iluminando uma rua e seus transeuntes: “Um dia escreverei um poema”, o autor da faixa e da foto é desconhecido, infelizmente, mas com certeza é poeta. Fico encantado, pois sou daqueles que acredita que todo mundo já escreveu um poema alguma vez na vida ou no bar, e que me atire o primeiro verso quem nunca teve seu momento de riscar rimas melosas em guardanapos úmidos e últimas páginas de um Tilibra.

É nessa questão que me indago: Como?

No geral, a pena do poeta-donzelo é sempre inaugurada pelo mesmo motivo: O amour! Seja ele o desesperado que platoniza em sala de aula ou o angustiado do primeiro encontro que chegou cedo demais; nesses casos, o terreno é fertilíssimo para que geralmente surja mais um Pablo Neruda pós-gripe.

Outra questão curiosa é: Como é possível que o mais alienado dos universitários ou a fã número um do Belo já tenha escrito os seus? Alguma cigana disse a eles que palavras rimadas apresentadas em versos e estrofes trarão a pessoa amada em três dias? - Não. Claro que não. É que nessa seara, se dá outro mistério da poesia, todo mundo além de escrever, já leu um poema na vida, nem que fosse aquele no mural da secretária da escola. E nem vou falar que a internet serve hoje com um trovador vanguardista, dizer isso seria como citar Clarice Lispector na rede. 

E se você ainda não escreveu os seus, lhe peço apenas calma. E que olhe não só para fora, mas para dentro: Para aquele poeta que há em nós, aquele com uma pena já fininha, tentando colorir a rotina, a pos-graduação, o transito e o patrão nosso de cada dia. - Just calm, que sua hora chegará.

Mesmo aquele que nunca passou sequer por uma rua de nome Castro Alves, é capaz de ver florescer versinhos bobos e apaixonados ao final de suas cartas românticas. Assim como a infeliz donzela que rabisca um ‘amor com dor’ na agenda recheada de fotos e embrulhos de bombons. Disso ninguém escapou e nem quis escapar. Pode ter certeza, mesmo o bigodudo da mercearia ou seu sogro cafuçu, já largaram seus tacapes e fizeram a caveira de Shakespeare regurgitar ao rabiscarem seus sonetos munidos de seus tocos de lápis ou pedaços de carvão.

Uma vez, tive a ousadia de dizer entre amigos que não gostava e nem lia poesia. Sim, eram tempos de trevas para este que vos escreve. Hoje assumo a importância de se ler mais poesia. Mas mesmo ali naquela fase de cegueira poética, escrevia meus parcos versinhos em homenagem a Ela, e Ela foi educada a tal ponto que me elogiou. Ela, era sábia, não se critica um Drummond de primeira viagem. Ah! Quantos crimes se cometem nome da poesia.

Ela, a minha primeira musa, não se encantou por aquele pobre rapaz carente de vitaminas líricas.

Hoje
Ela
É quase noiva
Pois é,
Ela ainda noiva
Se bobear já noivou
O namorado d’Ela ou agora noivo
não tem cara de quem escreve ou que lê
nem que faz rimas, odes, sonetos e madrigais enquanto a espera sair da aula
O atual noivo d’Ela
tem carrão
mora na parte de cima
e é formado em direito
como todo mundo
Hoje
Ela, não vale o poema ruim que inspira.

É curioso. Assim como o primeiro verso do poeta de fim de semana, essa crônica inteira me floresceu entre os dedos assim que vi a tal foto, e daí ele foi se antecipando e tomou a frente de outro relato que eu iria escrever: Um sobre a minha carreira de radialista, essa, foi bem mais duradoura e prolifica que a de poeta, durou cinco dias de minha adolescência.

Cid Brasil

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