(Salvador Dalí) |
Jogador de futebol, radialista,
humorista, jornalista... – Passando um parêntese antes de cada uma dessas
atividades e inserindo dentro deles as palavras: ‘quis ser’- Creio que fica
melhor do que dizer que tentei... As seis peças de teatro em que atuei talvez
me credenciem como ator em alguns meios. Minha carteira de trabalho avisa que o
seu dono exerce o oficio remunerado de auxiliar administrativo, desde 2003. Em
alguns hotéis coloco o nome ‘poeta’ como profissão (Pois poeta para muitos é tudo,
para outros não diz absolutamente nada).
Quando me perguntam o que gosto de
fazer, tenho quase o ímpeto de responder: “Rapaz, eu gosto de ler”. Por vezes
evito, já que hoje todo mundo diz isso. Então aqui respondo: “Gosto mesmo é de
ficar na janela”. – Agora, estou nela: É noite de São Pedro (dizem!) a fumaça
das fogueiras da uma fotografia de sonho para o que vejo: Um rapaz com a camisa
do flamengo andando com pressa a frente de um senhor, que pela aparência e
intimidade nos reclames parece ser seu avô, o velho mancando, está tipicamente
fantasiado velho como os velhos do interior: Camisa branca, calça social cinza,
sandálias de couro e chapéu preto; a pracinha do lado de lá da esquina tem uma
negritude instantânea, que vira palco para as bombas e chuvinhas de duas
crianças; na casa de frente reaparece uma mulher que há tempos gostaria de
fotografa-la, pois ela me lembra aquelas mulheres solitárias dos quadros de
Hopper, sempre a vejo de minha janela em muitas noites iguais e diferentes a
esta, sempre fumando, sempre só. Desta
vez ela está no escuro. E proporciono a ela o que melhor posso oferecer nesta
vida/noite: Eu comendo pipocas na minha janela, sinto que meu desempenho é
pífio (ou ela é uma das que não acreditam em janelas), pois agora a mulher do
cigarro tem também um celular nas mãos que ilumina seu rosto cansado, o que vê
ali? As ligações recebidas? Relê as mensagens quase decoradas? Verifica e-mails
ou lê alguma crônica? – Talvez se sinta incomodada com alguém vendo seu retrato
solitário. O velho e o menino seguem reto na rua e no meu olhar, cada vez mais
distantes um do outro, tornando assim mais longo o suplício e a distância do
vovô que ainda quer conversa. Na praça: As bombinhas acabaram, assim como as
crianças. O cigarro da moça também. Antes de levantar, ela não responde (ou não
vê!) o tímido aceno que faço.
A fumaça de seu finado cigarro se
junta as das fogueiras já mortas.
***
Me lembro de uma amiga que nas
madrugadas de incertezas sobre si, a única certeza que diz possuir nesses
momentos é a de querer ficar no escuro. Dias depois me contou sobre, e perguntou
por que apagamos as luzes quando estamos muito tristes. Seriam todos assim? Na
ocasião eu disse que era para não vermos nossa própria condição por alguns
minutos. Para evitarmos as janelas e os que nos veem através dela. Para não
enxergarmos nossas pernas cansadas.
De todos os personagens desta noite de
São Pedro, os únicos que ainda insistem com luzes e palavras: Somos eu e o
velho que manca.
Cid
Brasil