quarta-feira, 2 de outubro de 2013

ROTINA




 
(Santiago Caruso)

Agente às vezes viaja pra ser original lá fora ou pra renovar o olhar sobre o mesmo, dizem uns. As mesmas roupas, os mesmos caminhos, as mesmas frases... Eu tento muitas vezes misturar, olhar com mais atenção até mesmo pro meu rosto no espelho. – Creio que se não fosse assim a minha literatura estaria perdida. E eu também.


Olhar diferente para o cotidiano é difícil, eu sei. É mais fácil a comunicação entre homem e animal existir através das palavras... Quem dera! Só assim o gato aqui de casa (Que não sei se é ela. Até isso é difícil saber) – bom, só assim ele (a) me entenderia; compreenderia que minhas reclamações contra a sua preguiça não são por sovinice em dividir a minha ração, mas sim pedidos para que ele ache o grilo que me atazana há dois dias com aquilo que as fábulas ousam chamar de cantoria. Permitam-me aqui, caros leitores, cair na minha própria lorota: O cara que escreveu sobre o grilo falante ou grilo boca de cantor, não tinha grilo em casa, e querendo que as coisas mudassem um pouco, lascou a pena no papel e inventou essa. Deve ter acordado querendo enfrentar diferente o frio na Noruega.


Ou


Padecia do mesmo mal que eu sofrendo com esses desafinados. E também com a falta de entendimento de nossos gatos a uma ordem fina de ataque. Sabem tudo os bichanos: Truques, manhãs e até chantagens, ouvir eles sabem, mas não aprenderam a falar ainda. Anos de evolução, estrelas do youtube, recordistas de likes no ‘face’... E nem uma mísera palavrinha, coisa tão fácil que até idiotas mestres como nosso governador conseguiram. – Se bem que ultimamente nem ele tem se valido desse artífice.

Aguardemos.


Falar no cidadão e na cidade que jaz o gato, o grilo, o papagaio e o cronista... Exercitar a percepção para o inédito ou para o micro é mais até do que algo poético: É necessário! Enxergar borboletas voando nos entulhos de nossa cidade em desconstrução, nossos reflexos nas poças d’água de nossas vielas, o brilho no olhar do ladrão que nos rende, os suores que percorrem todo o corpo de uma bela ninfeta num coletivo lotado (e parado), silenciar perante a selvageria quase orquestrada de nossos irmãos motoristas... Hoje mesmo, vinha eu assim, meio abobalhado percebendo a ninfa e o todo (no caso o congestionamento) e quis entrar numa ruazinha paralela e outro cidadão me antecipou, buzinei timidamente e ele baixou o vidro e me estendeu seu belo trinta e oito. Devia estar a venda, ou precisando de vitamina D, pois só estendeu para cima, resplandeceu ao sol e seguiu. Cheguei em casa e o mal que e o meu gato do mesmo jeito. Sim, pois ele (ou ela) sobe em minhas pernas e depois na mesa enquanto almoço, boceja enquanto releio está crônica em voz alta - O grilo continua lá e mia alto enquanto tento cochilar: Ou seja, são igualmente mal educados e revoltados comigo. Os motivos de ambos para agirem assim, eu desconheço. Deve ser fome.


O mal do motorista também. Afinal, era meio dia. E era em Maceió.


 Cid Brasil

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