Agente às vezes viaja pra ser original lá fora ou pra renovar o
olhar sobre o mesmo, dizem uns. As mesmas roupas, os mesmos caminhos, as mesmas
frases... Eu tento muitas vezes misturar, olhar com mais atenção até mesmo pro
meu rosto no espelho. – Creio que se não fosse assim a minha literatura
estaria perdida. E eu também.
Olhar diferente para o cotidiano é difícil, eu sei. É mais fácil a
comunicação entre homem e animal existir através das palavras... Quem dera! Só
assim o gato aqui de casa (Que não sei se é ela. Até isso é difícil saber) –
bom, só assim ele (a) me entenderia; compreenderia que minhas reclamações
contra a sua preguiça não são por sovinice em dividir a minha ração, mas sim
pedidos para que ele ache o grilo que me atazana há dois dias com aquilo que as
fábulas ousam chamar de cantoria. Permitam-me aqui, caros leitores, cair na
minha própria lorota: O cara que escreveu sobre o grilo falante ou grilo boca
de cantor, não tinha grilo em casa, e querendo que as coisas mudassem um pouco,
lascou a pena no papel e inventou essa. Deve ter acordado querendo enfrentar
diferente o frio na Noruega.
Ou
Padecia do mesmo mal que eu sofrendo com esses desafinados. E
também com a falta de entendimento de nossos gatos a uma ordem fina de ataque.
Sabem tudo os bichanos: Truques, manhãs e até chantagens, ouvir eles sabem, mas
não aprenderam a falar ainda. Anos de evolução, estrelas do youtube,
recordistas de likes no ‘face’... E nem uma mísera palavrinha, coisa tão fácil
que até idiotas mestres como nosso governador conseguiram. – Se bem que
ultimamente nem ele tem se valido desse artífice.
Aguardemos.
Falar no cidadão e na cidade que jaz o gato, o grilo, o papagaio e
o cronista... Exercitar a percepção para o inédito ou para o micro é mais até
do que algo poético: É necessário! Enxergar borboletas voando nos entulhos de
nossa cidade em desconstrução, nossos reflexos nas poças d’água de nossas
vielas, o brilho no olhar do ladrão que nos rende, os suores que percorrem todo
o corpo de uma bela ninfeta num coletivo lotado (e parado), silenciar perante a
selvageria quase orquestrada de nossos irmãos motoristas... Hoje mesmo, vinha
eu assim, meio abobalhado percebendo a ninfa e o todo (no caso o
congestionamento) e quis entrar numa ruazinha paralela e outro cidadão me
antecipou, buzinei timidamente e ele baixou o vidro e me estendeu seu belo
trinta e oito. Devia estar a venda, ou precisando de vitamina D, pois só
estendeu para cima, resplandeceu ao sol e seguiu. Cheguei em casa e o mal que e
o meu gato do mesmo jeito. Sim, pois ele (ou ela) sobe em minhas pernas e
depois na mesa enquanto almoço, boceja enquanto releio está crônica em voz alta
- O grilo continua lá e mia alto enquanto tento cochilar: Ou seja, são
igualmente mal educados e revoltados comigo. Os motivos de ambos para agirem
assim, eu desconheço. Deve ser fome.
O mal do motorista também. Afinal, era meio dia. E era em Maceió.
Cid Brasil
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