domingo, 11 de agosto de 2013

O PAI PRÓDIGO



(Giorgio de Chirico)



Aqueles que mandam nos calar perante o William Bonner; os que bocejam nos passeios; os que cedem as tentações; os que usam apenas da força; os primeiros a saltarem do barco; aqueles que nunca estão em casa mesmo quando estão; os que não voltam quando precisamos – E quando voltam é porque precisam de nos; aqueles a quem um abraço é mais caro que um carro e um olhar mais dolorido que qualquer palavra...  São eles os representantes do lado falho e demasiadamente humano de nossas casas: O meu foi tudo isso. Tinha muitos amigos ele, mas só me lembro de um que foi até mais além nesses quesitos.


***


Ele chegou: Cara de menino ainda, cabelo na testa, camisa folgada e com uma criança no colo; sua esposa devia ter um ano menos que ele. “Esse é meu filho!”. Fiz aquele meneio de cabeça que fica ‘entre o não entendi e o espanto’. “É meu filho!”. Ele repetiu.

Dalvan tinha quinze anos quando me apresentou seu filho. Até ali, a coisa mais importante que eu tinha feito, havia sido uma atuar numa montagem teatral onde fazia de maneira canhestra um alcoólatra, um personagem torto e desiludido: Um pouco parecido com o pai que Dalvan teve. 


“Eu quero ser o pai que nunca tive.”, foi o que ele falou, quando perguntei como era tudo aquilo para ele. 

O meu, só me deu um abraço de verdade quando eu tinha a idade em que o Dalvan foi pai: Foi meu presente surpresa numa festa idem. O Dalvan, eu imagino que nunca recebeu um abraço de seu pai. O pai do Dalvan e o meu eram amigos. Só me lembro hoje do amigo de meu pai por causa do Dalvan.


Dia desses, eu reencontrei o menino Dalvan; estava com dezenove anos, já pertinho dos vinte. Não era mais o menino que vinha aqui na minha casa, ou adolescente desajeitado que me mostrou seu filho há quatro anos; talvez por isso eu não tenha reconhecido de imediato aquele moço de voz grossa que foi logo me dando um abraço igual o meu pai no meu aniversário. Perguntei logo pelo seu filho e sua esposa. “Em casa e bem”. Senti a satisfação quando lhe perguntei mais por eles, suas respostas foram mais sinceras que o seu abraço.


É pelo Dalvan que acredito que a geração ‘noventa’ irá pelo menos render pais melhores do que os que tivemos. Pelo menos.


Não escolhemos os nossos e também, creio que não trocaríamos. Hoje, se não fosse os quinze anos de gritos e tapas até Dalvan ter um filho, quem sabe ele não seria capaz de ainda lamentar que o seu pai não tenha conhecido o seu neto.  E eu, se não fossem um pouco dos erros e arrependimentos do seu Donatilio Soares Martins, é possível que eu não estivesse aqui escrevendo e lembrando todas as vezes em que sonhei com aquele abraço.


Não recordo quem falou que quando se é pai, se perde até o direito de morrer. O meu, infelizmente desrespeitou até essa máxima. No entanto não é com mágoas que me lembro dele, mas sim com saudades.

Cid Brasil

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