(Videodrome, David Cronnenberg) |
1.
Foi com
Tony, meu primo, que assisti a Um Drink
no Inferno, de Robert Rodriguez, pela primeira vez. A locadora era daquelas
com mais poeira que qualidade nas prateleiras. O filme
abre com uma estradinha perdida no deserto americano e logo em seguida é
mostrado o interior de uma pequena loja de conveniências a beira da estrada. Há
certa tensão nos diálogos entre o balconista da loja e o xerife local nesse
inicio. E do nada, Quentin Tarantino travestido de bandido, sai de seu
esconderijo e explode a cabeça do policial com um tiro preciso. Lembro do
enorme espanto que tivemos nessa cena. Numa sequencia inverossímil logo depois,
os bandidos queimam o xerife local com o álcool das garrafas nas prateleiras e
o posto explode. Paramos aí de assistir, pois meu primo, então com sete anos,
começou a chorar desesperadamente.
2.
Falta
de sensibilidade minha, já que o pai de Tony, meu Tio Fredo, era delegado da
policia civil e sua mãe, Tia Berta, recém tinha sido admitida numa loja de conveniências
num posto no Farol. Após acama-lo, dizendo que ninguém iria atirar no sei pai nem queimar sua mãe viva no emprego, voltei na locadora, devolvi o terrível filme, cedi as
chantagens e locamos Xuxa Requebra. Talvez eu tenha influenciado diretamente na futura profissão do meu primo, que hoje é dançarino numa banda de forró. Ou talvez não, vai ver era só o filme errado na hora errada.
3.
Tínhamos
dois videocassetes em casa e o meu passatempo preferido era gravar cenas da TV
por cima das velhas fitas caseiras: Era um mix de Charles Bronson versus
minha mãe fazendo bolos, dezenas de sequências mal filmadas da inauguração da nova
casa com o Mel Gibson atirando para cima numa festa de Máquina Mortífera enquanto
cantávamos os parabéns pra você para algum parente que já esqueci, mas que bem podia ser o Zacarias. Assim, boa
parte da minha infância foi gasta assistindo televisão com dois controles
remotos na mão e nada na cabeça, um destruidor dos arquivos da família.
4.
O papo
de pai era que muito videocassete iria estragar a TV. A mesma conversa no quesito videogame e em relação a saúde dos meus olhos. O papo do dono
de locadora era só o de rebobinar as fitas na devolução. E o papo de mãe era
que não tocasse na gravação do seu casamento, pelo menos não naquela fita!
5.
Numa
dessas incursões como DJ de imagens, acabei encontrando a tal fita e no lugar
do padre perguntando se minha mãe aceitava meu pai como legítimo esposo, pus o
Stallone Cobra dizendo que o bandido era a doença e ele era a cura. O baile e
os desejos de felicidades dos convidados ficaram entremeados com a Carla Perez
apresentando o Fantasia. Lembro que minha mãe chorou bastante ao ver o
resultado, pois com minha intervenção, acabei por excluir seu pai da festa de
casamento e aquele, disse ela, era o único registro dele que tínhamos.
6.
Outro
dia marcante foi quando descobri uma função chamada “gravação programada” no
menu do videocassete. Minha primeira atitude foi acertar os relógios da TV e do
vídeo com o do canal 5 e deixar o Cine Prive e alguns peitos
rosados invadirem a fita.
7.
Na
manhã seguinte eu só faltava ter uma taquicardia de tão ansioso. Na verdade
quase tive dois ataques: Um de ansiedade e outro de raiva ao dar o play e me
deparar com vídeos institucionais da LBV seguido de uma mão vendendo joias e o
logo da bandeirantes estático por cinco horas consecutivas. Só depois vim saber
que os púbis cabeludos do Cine Prive eram apresentados somente aos sábados... Another time in TV, another wrong
hour. Adjust your tracking...
Cid Brasil
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