quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

FÁBULAS



(Hieronymus Bosch)



Diz a bíblia (esse livro tão citado quanto realmente lido): Quando (...) deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. (...) Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita (...) teu Pai, que vê em secreto, ele mesmo te recompensará publicamente”.


Devo admitir que o governo do estado de Alagoas, se valeu por muito tempo de tal passagem bíblica listada a partir de Mateus 6. Tanto, que esconderam tão bem a esmola, que nem a direita (a própria direita!) e muito menos a esquerda (a própria esquerda), nem tampouco nossos olhos ou os ouvidos ouviram por oito anos, qualquer barulho de corneta ou níquel pingado em nossos chapéus.


No entanto, contrariando questa passagem, alguém que não mora em Alagoas, mas que trabalha para o dono das mãos que esconde seus feitos tão bem – até de si – teve a brilhante ideia de finalmente fazer tocar os trombones, as sanfonas e os pandeiros. Para isso, convocaram até um músico como garoto propaganda dessa orquestra invisível (que segundo este jovem cronista, trata-se do único cidadão conhecedor de cor e salteado de nosso hino). Aos olhos da esquerda, a única coisa escondida foram os ouros que deve ter ganhado não só o cantor como os atores e civis que interpretam fábulas em HD sobre casas recebidas em troca de feijões mágicos, auxilio a dependentes químicos de docinhos da vovó, grandes indústrias que por aqui fabricam sonhos e tapetes voadores apelidados de rodovias.


Como se não bastasse tamanha ostentação de película, utilizam verdadeiras ameaças veladas como moral de cada história: “É só vir aqui para ver!” ou “hoje foram os três porquinhos, amanhã pode ser você”.

Dura trinta segundos a visão do paraíso.
 

Assim como outras formigas do reino do era uma vez, eu fui um dos que não conseguiram dormir após comer a maçã envenenada. E meu maior medo é que no próximo tratado televisivo os publicitários, digo, os trovadores e os grilos não só nos ameacem com a trombeta do inferno em punho, como bradem: “Não reclame! Você já se perguntou como vivem os personagens do Maranhão?”.


O verdadeiro ficcionista mor (e fichinha em citações) William Shakespeare – que em outras ficções é até colocado como um dos autores do livro dono da citação que abre essa crônica – encerra a vida de seu protagonista em sua farsa sobre outro reino podre da seguinte forma: “O resto é silêncio”.


Talvez seja o que as madrastas e os lobos queiram.


Cid Brasil

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