segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

ARMARINHO MARAVILHA


(Henri de Toulouse-Lautrec)



Ajeitou os seios que cansavam o tomara que caia, mirou aquela moça branca cheia de sardas e disse que Magali não era um bom nome para uma prostituta, “não dá tesão mulher!”. Mesmo assim Magali quis ser Magali também ali; não viu sentido em usar tudo da Magali naquele lugar menos o nome. “Por que outro nome? Mudava alguma coisa?”, se perguntou enquanto recebia a nova farda: Minúscula, uns dois números a menos e de cores quentes contrastantes. E as instruções: “Ao fim do dia, vinte por cento do apurado fica com a casa, para custear as despesas.” 

Não tinha o que esconder, das cinco da manhã até o meio dia vendia pastéis na porta de uma faculdade, e de lá agora partia para a nova função, que rendia um pouco mais. Cobrava quarenta reais para ouvir e se deitar com qualquer um. “Trepar mulher; que se deitar, se deitar agente se deita sozinha!”, escrachou a ‘Madrinha’, como era conhecida a grandalhona, dona daquele lugar que não era apenas um bar, nem só bordel e tampouco casa de massagem como anunciava o cartão – Embora dentro fosse tudo isso -, e a crise de identidade se estendia bem além de sua fachada de simples residência, perseguia até os que ali entravam, quando meses depois ao chegar nas faturas os valores de um certo: “Armarinho Maravilha”. Todo mundo ali parecia ter o que esconder, até a ‘Madrinha’, que já não tinha nem corpo, nem seios, nem ancas e muito menos idade para tão pouco pano.

O primeiro cliente de Magali foi uma constante dos outros. “Até aqui eles mentem?”, comentou com Valmira/Pâmela. Todos que nos quartos entravam eram casados, importantes e carinhosos, mesmo aqueles sem marca de aliança, sem marca nas roupas e sem marcas nos lábios. Por vezes aconteceu de alguns meninos, clientes seus da manhã, dos pastéis, aparecerem lá; assim, como aqueles nem tão meninos e nem tão simpáticos dizerem cheios de pudor: “Você por aqui?” e ouvirem a mesma coisa de Magali, só num tom mais cínico e espontâneo.

A única coisa que Magali tinha de esconder era a idade, e também seu sonho de um dia chegar finalmente a juntar o valor pedido pela justiça para soltar o seu pai. As sextas gostava de ver a ‘Madrinha’ bem humorada por ver a casa e o sofá cheio, soltar piadas, a melhor até agora havia sido: “Daqui a uns anos agente vai vender é beijo na boca, e a macharada vai perguntar, toda apaixonada, se agente também trepa!”

Cid Brasil

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