segunda-feira, 16 de setembro de 2013

JAPÃO


(René Magritte)



- Menino. Como é que você vê o mundo?
- Ah, tio! Eu vejo o mundo dentro da minha cabeça: Imagino que os jogos da escola e daqui da rua passam na TV; que a Mariana sente o mesmo que eu; que quando eu saio os bonecos andam sozinho, mas isso é culpa do filme eu acho. Eu acho também que tudo que eu penso acontece, que se eu não fizer coisa errada o que eu quero acontece. Tem dias tio, que eu sou o homem aranha e em outros sou o Chapolin. Tem noites que eu tenho medo assim do nada. Deve ser porque eu quero que ninguém vá mais embora daqui de casa. De manhã eu sempre me olho no espelho e tento ver como eu vou ser quando crescer, com vai ser a minha cara. E o meu diário tio, tá todo em branco. O senhor também é assim tio?

- Igualzinho, só que todos os dias eu me olho no espelho pra me lembrar da minha cara quando criança.
- Tio, como é envelhecer?
- É ficar desconfiado até dos próprios sonhos.
- Me faz uma pergunta tio?
- Tá. Você acha que sabe tudo, não é?
- Sim!
- Que o mundo só existe por sua causa não é?
- Aí tio, para com isso! Tá bom já.
- Desculpe.
- Tá desculpado. O senhor não sabe fazer perguntas tio. Deixa eu fazer.
- Tá bom.
- O senhor escreve diário tio?
- Sim. Todos os dias.
- Por que será que eu não consigo tio?
- Por que se você escrevesse, eu não estaria aqui conversando contigo.
- Anh?
- Deixa pra lá.
- Que cor é o seu diário tio?
- Azul. Era vermelho. Agora é azul.
- O senhor mente?
- Só quando falo.
-Tio?
- Oi?
- O senhor tá certo... Eu acho que o mundo é filme. E eu ator-protagonista. E o senhor?
- Bah... Eu trabalho na produção.
- Tio, quando tu fechar o teu diário azul, o que vai acontecer comigo?
- Você vai levantar da cama, se olhar no espelho, só molhar o cabelo e finalmente vai acordar. E eu estarei dormindo.
- E é Japão é?
- Se você quiser é sim.
- Tchau, tio!
- Tchau rapaz. E pare de chamar os outros de tio.
- Tá ti... Desculpa moço!
- Ok.
- Eu vou me lembrar de você moço?
- Só quando eu for você.
- E isso pode é?
- Aí no Japão tudo pode.
- Tchau!
- Tchau.

(...)

"Menino! Menino! Ó Menino! Acorda menino! Acorda que tá atrasado pro colégio menino..."

Cid Brasil

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