(Mistérios e Paixões, filme de David Cronnenberg) |
1.
Ao
ver sua conferência intitulada “tema livre” ir naufragando aos poucos,
Alejandro Zambra resolveu falar sobre um tio que detestava argentinos e que
certo dia se viu vitima do próprio veneno ao ser confundido com um argentino. Apanhou tanto das pessoas que o
confundiram que só teve forças para chegar em casa e desmaiar aos pés da
mulher. Vendo o estado lastimável do marido, ela lhe perguntou o óbvio: Porque,
afinal, não desfez o engano dizendo que era chileno. O tio de Zambra respondeu:
“É que me encanta que moam de pancadas esses filhos da puta na rua!”.
2.
Um
repórter da TV manchete estava em Berlim para cobrir a queda do muro, que recém
havia sido derrubado, e buscando algo com que preencher a matéria, notou um
casal na rua falando em português e pediu para eles darem um depoimento sobre o
fato histórico. Gravaram e o entrevistado se apresentou como José da Silva,
comerciante. Só quando a fita chegou ao Brasil foi que um diretor reconheceu
que aquele “José da Silva” tratava-se na verdade de Rubem Fonseca, famoso
contista e famoso também por detestar entrevistas e fazer qualquer pose como
escritor. Quem conta essa é Ignácio de Loyola Brandão. Segundo ele o repórter,
por perder o furo, perdeu também o emprego.
3.
Só
conheço piadas envolvendo escritores, eis a minha obra com a qual vou me
enganando dia após dias, o que termina por me fazer agir igual aos clientes de Henry Miller, que
no começo de seus anos de esbórnia em Paris, trabalhou como garçom e revelou se divertir ao reproduzir uma esquete de Marcel Marceau, o mímico, perante os clientes
insatisfeitos.
Conta ele que quando alguém reclamava do filé ou das bebidas que
trazia ele as levava de volta até a cozinha, demorava alguns minutos por lá, às
vezes só virava o filé ao contrário e tornava a trazer o mesmo prato para a
mesa, sem sequer assar mais a carne ou mudar a bebida em questão. O milagre,
segundo ele, era impressionante. As coisas se transformavam com essa ilusão de
mudança na cabeça das pessoas. Isso só acabou quando o patrão resolveu fazer o
mesmo com seu salário, fingindo que o pagava.
4.
Há um
conselho muito famoso entre os romancistas de que para escrever um romance, as
condições ideais seriam cometer um crime na Suíça e passar uma
temporada em uma de suas penitenciarias, devido a limpeza das celas, a
qualidade das refeições, a discrição dos presos e organização geral. “Cometam
um crime na Suíça”, é o conselho que os mais velhos dão aos seus pupilos.
5.
Emmanuel
Carrére, na biografia de Philip K. Dick, escreve que o mestre da ficção
cientifica foi perseguido pelo Macarthismo nos anos 50 e que teve até dois
agentes do FBI na sua cola por um tempo. No dia em que os agentes bateram na
sua porta a fim de saber das suas ligações com o comunismo (só por que sua
esposa era membro do partido socialista) perguntaram-lhe a queima roupa se ele
tinha ligações ou simpatias pelos russos, Dick, imagino que tentando fritar os cérebros
dos agentes, quase se deu mal ao responder:
--
Não – e logo depois completar – Mas quem garante que se eu fosse comunista não
responderia a mesma coisa?
6.
Um
minuto de silêncio para todos aqueles escritores que entenderam mal o conselho
de cometerem um crime e acabaram aprontando na Turquia e não a Suíça, onde revivem, dia após dia, as cenas que vimos em “Expresso da Meia-Noite”, filme
de Alan Parker.
7.
Por
falar em piadas e tragédias: Nunca saberemos se William Burroughs matou de fato
a esposa com um tiro de espingarda na cara ou se estava apenas brincando de Guilherme
Tell – segundo ele mesmo disse a polícia – tentando acertar um copo acima da
cabeça de sua companheira.
Cid
Brasil